quarta-feira, 20 de maio de 2015

Hoje é domingo


Eu passei muitos dias das mães com a necessidade de mostrar ao mundo que eu não tenho uma. Não que eu não tenha a quem abraçar, o que me falta são os motivos para. O mundo ao meu redor já me libertou daquela sensação de que “se não fosse ela vc não estaria aqui”. Primeiro porque a existência é trágica, e segundo porque rejeito a sensação de dever favores a minha parideira... É isso que chamam de amor por aqui? Um “obrigada por me trazer a este mundo”? rs 

Eu passei muitos dias das mães tentando encontrar em mim a culpa. Tentando achar explicações pro timbre da voz dela ser tão insuportável. Pro jeito que ela pisa no chão com raiva e pressa sempre, me soar tão desesperador. Explicações para a tristeza que me invadia, quando eu ouvia o portão de casa abrir anunciando a chegada dela. Explicações para quase nunca me sentir bem ao lado dela. 
Passei muitos dias das mães temendo a atividade escolar que propunha homenagens, propunha o caralho, quase obrigava. Que argumentos eu daria pra professora pra convencê-la de que eu não queria fazer a cartinha? 

Eu passei muitos dias das mães tentando dar as pessoas os meus motivos mais íntimos pra não poder abraça-la. E muitos outros dias das mães procurando na minha intimidade os motivos pra NÃO QUERER MAIS abraça-la... Passei muitos dias das mães vasculhando dentro de mim, os motivos que estavam fora. Encontrei um a um, todos dados por ela.  

Daí que a expansão da consciência diminui o peso deste dia, quando vc descobre que as datas comemorativas são 99% comerciais. Mas isso foi inútil por muito tempo... Principalmente quando você abre o facebook, ou quando acorda e ela ainda não chegou do role de quinta... 

Eu passei muitos dias das mães me lamentando por querer abraçar alguém que tivesse o peso “mãe” na minha vida. 

Faz uns 3 dias das mães que eu deixei meus ombros caírem como quem desiste...




Só abaixo minha minhas armas e deixo o combate, com 90 das vagas das faculdades!


é triste ter que destacar que EU NÃO ESTOU "CONTANDO VANTAGEM" (como dizem os zé porva). 


De todas as minhas 14 (quatorze) primas, apenas 3 (três) tiveram acesso ao ensino superior e detalhe: particular. E não estamos falando de custear uma mensalidade na PUC ou no Mackenzie, mas na Uninove e na Anhanguera mesmo... E também não estamos falando de cursos como Medicina ou Curadoria e Crítica, mas de Administração, Logística ou Marketing mesmo... Porque a inclusão educacional existe e funciona: Até a página cinco.


Há poucos anos atrás, ensino superior era exclusividade de patrício branco. Vagarosamente a cena muda, graças aos programas do governo federal: Malditos petralhas! Depois do PT, a filha da empregada – preta e pobre – divide a sala de aula com a filha da patroa – branca e rica. E será que existe desespero maior para a elite brasileira do que pobre tendo acesso ao conhecimento? 

Iniciei minha carreira acadêmica na FESPSP. Instituição privada, elitizada, racista e conservadora que é tradição no ensino de Sociologia e Política há mais de 80 anos. Sim, pasmem https://perspectivismos.wordpress.com/2013/08/28/a-insuficiencia-do-sistema-publico-de-ensino-e-seu-reflexo-na-academia/
Depois que fui expulsa por ser bolsista e polêmica, (pq não dá pra ser, pobre preta, bolsista e ainda querer ser polêmica) me dediquei a possível chance de estudar de graça. Fiz ENEM e pelo SISU entrei na Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP (CHUPA ATEUS).
Entendo que isso pode não significar muito pra quem sempre estudou em colégio trilíngue, ou pra quem fez cursinho pré-vestibular custeado pelo pai com mensalidade equivalente a soma da renda dos três assalariados da minha família, eu entendo. MAS, pra quem passou a vida estudando em escola pública de quebrada que forma consumidores passíveis e não mentes pensantes, significa MUITO! Significa PRA CARALHO! 

Não se trata de uma vitória individual, mas coletiva. Vitória não apenas minha, mas dos meus. Vitória que começa a enegrecer o cenário. Vitória que contraria as estatísticas. Que me faz ser a primeira de muitas. E sinto um orgulho e uma responsa tremenda por estar ajudando a construir os primeiros degraus de subida numa escada que finda no início do progresso da juventude negra e periférica. Início porque sou exceção, mas, estou fazendo história e contribuindo para mudar a história. E isso não é exagero! Sei que existem jovens que aos 22 anos já são “alguém na vida”. 
Bem como, tenho amigas de 22 anos que não sabem LER. 
Algumas internadas em clínica de reabilitação porque o pó as dominou. 
Outras em casa com seus três filhos apanhando do marido. 
Outros na cadeia.
E ainda os que aguardam a cadeia como possibilidade mais positiva, pois, aos 15 trabalham de campana da loja da vila e nem por milagre chegarão aos 22 com vida!
Foram essas pessoas que cresceram comigo, e são essas pessoas que eu conheço. Mas, não é com essas pessoas que vou estudar. Então, vamos mesmo discutir essa pressão do tempo que o sistema exerce sobre nossas vidas, para que sejamos “alguém” logo? De preferência antes dos 30? Vamos mesmo questionar o tamanho da minha vitória? É, acho que não, mesmo.

Passei na Federal, sim. Mas sou uma exceção! E não vou aguentar que se apoiem em mim para tratar da regra. Continuo sendo exceção e não vou tolerar aquele papo meritocrático bizarro! Porque não! Não basta querer. Não basta se esforçar. Não basta ignorar as circunstancias que me cercam. Se bastasse, eu não seria exceção, mas regra. Se bastasse, eu não estudaria com a filha da patroa, mas com minha amiga de infância. Se bastasse, não haveria necessidade de cotas raciais e cotas para provenientes do ensino público. Se bastasse, as universidades não seriam tão esbranquiçadas e elitizadas. 

Passei na Federa sim! Ma, não dá pra viver em paz, enquanto eu estudo, trabalho, alimento perspectivas de sonhos e um irmão meu, não. Uma irmã minha, não. Não dá pra viver em paz, enquanto eu abasteço a prateleira com meus sonhos, para que aqueles com dinheiro os comprem. Não dá pra viver em paz, enquanto eu pego o ônibus pra ir "ser alguém" e deixo os meus no relento com a certeza de que "serão ninguém". 
Não dá pra viver em paz, porque eu sou exceção. Sou pobre, preta, periférica, mulher e acima de tudo, sou uma jovem que não se resignará perante a imundice do nosso tempo. Eu troco minha paz, pela luta! E creio que um dia valerá a pena, mesmo que eu não esteja viva para ver, valerá a pena!

Sigam-me os bons! 

quarta-feira, 6 de maio de 2015

Fight Club



Registrar ponto, horário de entrada, almoço e saída. 
Tudo controlado, acesso a internet, tempo livre, mijar, cagar, beber água, tudo. 
Trabalhar pra enriquecer o outro, e ser tratada de uma maneira desonrosa. 

Entro no trabalho antes do Sol nascer e encerro quando ele já se foi, passo 10 - ou mais – horas do dia trabalhando para sobreviver. 
Será mesmo que é para “sobreviver”? Ou para sustentar um nível de consumo ditado pelo capitalismo? 

Consumimos desenfreadamente como se isso diminuísse a nossa pobreza existencial. (risos) 

Perco minha vida, com o objetivo de “ganhá-la”, paradoxo hilário. 

Eu trabalho num emprego que odeio, para comprar coisas que não preciso, para impressionar pessoas que nem conheço. Passo mais tempo com desconhecidos do que com minha própria família. 

Este é meu dia, esta é minha vida, e ela acaba um minuto de cada vez.

Pior do que ser, é fingir que não é.

Teve uma vez que eu postei: “Passei da fase de me irritar com boy querendo ser pobre. Hoje eu rio, apenas rio”, era tudo mentira, ainda to na mesma fase... 

Cena de grande horror pros playboys. 


Eu penso que playboy comovido pode sim militar nos movimentos, claro que pode. O que não pode é querer pagar de pobre. Sem PROCEDER não para em pé! Lembra dessa letra do RZO que você conheceu ano passado quando decidiu “ser pobre”? Então. Assim que é...

A ausência de legitimidade pra vocês falarem das opressões, é proporcional a nossa ausência de legitimidade pra falar de teóricos europeus brancos heteros e fodas. A diferença é que eu posso ler e adquirir o conhecimento, mas quem nunca passou fome, não pode voltar no tempo e passar “pra ter história pra contar”. Entendem? Claro que não, é por isso que eu escrevo pros meus...hehe

O que quero dizer é que patrícia branca lora não me representa. Querem protagonizar o filme que não viveram? Aqui não! Enquanto vocês lia eu vivia. Então menos.
E não adianta ir na Farm comprar roupinha surrada de 500 conto. Nem esse havaiana de tira azul e fundo branco consegue disfarçar o seu fedô de PATRICIA. Então menos. Bem menos.

Penso também que quando vocês propõem o fim da greve nas Universidades Federais se apoiando no pilar frágil de meia dúzia de aluno que conseguiu passe livre, por ex., vocês reproduzem justamente o discurso que dizem repudiar: USAR A EXCEÇÃO PRA TRATAR DA REGRA. 
Exemplo: “Ai lari, vc passou na federal tá vendo? É só querer! Se vc consegue todos conseguem”. (Sobre saporra eu falo em outro post). 

Engraçado que passaram a vida lendo Marx, pra ouvirem o que é luta de classes de uma favelada? Como se sentem agora? rs 
O objeto de estudo saiu do tubo de ensaio pra te dar oi. Sentar do seu lado na sala de aula, dividir o livro e o espaço esbranquiçado. 
Reconheçam que publico é outro, a favela está chegando na universidade e nem todo mundo recebe mesada pra pagar república perto da faculdade... 

Sendo assim, como mera cidadã esmagada pela pressão do sistema para que sejamos “alguém na vida” logo – de preferência antes dos 30 – , eu sou contra a continuidade da greve. 
Mas como estudante, favelada, pobre e preta que é a primeira de uma geração inteirinha a ingressar numa universidade pública, ainda defendo a continuidade da greve!

Quer somar na luta? Não fode.
Quer me foder? Me beija.  

Esse agora vai ser meu lema...rs


terça-feira, 5 de maio de 2015

Fulton Street


Se antes dos 30 eu conseguir alcançar este equilíbrio, corto meu cabelo (;

Acima da raiva, eu me conheço.
Acima da mágoa, me reconheço.
Acima da dor, me fortaleço.
Acima de ti, desapareço...

Racionalidade tem um preço
Dá vontade de mudar de endereço
Investir num recomeço
A todo perreco, agradeço!

Seu respeito eu não careço, mas mereço!
Mulher que luta, transpareço
Sobre sua conduta, emudeço
Sobre meu caráter, abasteço!

sem 
me 
apoiar
em 
quem 
não 
conheço. 

segunda-feira, 4 de maio de 2015

Sangue Quente

“é que eu sou fi de Cearense, a caatinga castiga e meu povo tem sangue quente. Naufragar segui pela estrela do Norte, das bença de Padim Ciço as letra de Edi Rock, cala a boca dos Lok, pois quem toma banho de ódio, exala o aroma da morte”




Eu tenho um caso de amor com o Nordeste. Primeiro porque sim. Segundo pela minha história. 

Sabe aquela clássica história dos jovens casais de nordestinos que destinam-se à SP para 'tentar a vida'? Então! Eu descendo de uma dessas inúmeras histórias e aprendi a me orgulhar disso, pois, em São Paulo a gente cresce aprendendo que não é legal ser nordestino, aliás, crescemos aprendendo que não é legal ser uma pá de coisa...

Minha família paterna é Alagoana e materna Piauiense. Então imagina? É muito amô! 

A periferia de São Paulo é povoada por nordestinos, justamente porque somos empurrados para as beiradas dessa cidade. Toda quebrada tem um 'bar do Ceará' ou de outro estado do nordeste. Toda quebrada tem pelo menos uns 10 manos com o vulgo de Bahia (como se todo nordestino fosse baiano). Toda quebrada tem uma casa do norte. Toda quebrada tem gente disposta a ajudar, gente de bom humor, gente que dá bom dia sem ser por obrigação. Ou seja, gente que não é paulista. haha
Na quebrada tem pessoas que fizeram o FAVOR de vir colorir São Paulo recebendo como prêmio – quando dão sorte de escapar da tragédia óbvia  – um sub-emprego de doméstica ou pedreiro que as torna figurantes na cidade. Pois, a história mais comum dos nordestinos que migram pra São Paulo, pode tranquilamente ser exemplificada pelo RAP, ahhhhh o RAP <3

Severino

Paulistas sofrem de síndrome de superioridade regional, acham que nordestino é uma "raça inferior" porque São Paulo é metrópole. Sim, não faz sentido nenhum, mas é isso. E como se fosse vantajoso morar em metrópole, né? 

O ódio ao nordestino é IRRACIONAL e INACEITÁVEL, principalmente quando parte de quem mora na quebrada, seja ela qual for. E agora que estamos mudando vagarosamente essa cena do loko, os paulistas tão com sua síndrome de superioridade regional atacada? Meu ovo esquerdo! Vão vomitar ignorância longe de mim! Não tolero! 

Sou preta, pobre, filha de nordestinos (que inclusive sabem votar), meu ex namorado é baiano, e antes dos trinta pretendo estar morando no Nordeste, rodeada de gente linda, com sotaque lindo, sorriso lindo, cor linda e cultura linda. Sem contar as comidas, affff <3 kkk

Então, se você é um babaca ou uma estúpida que inferioriza pessoas pela região em que nasceram, te desejo vida longa, para que agonizem assistindo 'os nordestinos dominando o Brasil!'

Beijas.