terça-feira, 11 de setembro de 2012

A vaidade sentimental


É obrigatório ser feliz?





Eu tenho preguiça de desejar bom dia, boa tarde, boa noite, uma preguiça indescritível. Talvez seja por fatores externos, que agora preciso expor, talvez não. Desejar um bom dia a outra pessoa é algo terrivelmente comum, que deriva de norma, e zombeteia de todos. Eu odeio fazer isso, mas sou obrigada a seguir o protocolo. Porém, estou convencida de que, se um terço das pessoas que lhe desejam “bom dia!”, deixassem de responder ou perguntar se “está tudo bem?” ou “como vai você?” e refletissem sobre o que exatamente estas expressões significam, talvez vivêssemos num mundo menos ordinário. As pessoas que dizem “tudo bem!” estão afirmando e não perguntando; isso é provado pelo fato de que, se eu responder “não!”, já vou ser tachada de mal-humorada e grossa. Mas, enfim, é de se esperar; afinal, é o comum, não é mesmo?

Pode parecer loucura eu estar questionando o normal que é aceito pacificamente pela grande maioria, mas enquanto eu não encontrar algo mais interessante a fazer, vou dizendo o que penso, e compartilhando minhas reflexões, talvez inúteis para outrem, importantes para outros.

 Mas o que realmente preciso expor é meu eterno ódio á ditadura do sorriso, á vaidade sentimental, ao congelamento da expressão serena.

Sentimentos? Todos temos um amontoado de sentimentos e sensações que estão a todo momento tentando se libertar de nós mesmos. Ao sabor da minha análise, sentimentos são como lâminas esterilizadas por xilocaína ou qualquer substância anestésica, para que não sintamos os cortes profundos que eles fazem.

Para que apenas vejamos o sangue escorrer, sem saber explicar o porquê.

Para que pensemos que o corte foi superficial, que não atingiu a alma. Para que possamos sentir a dor posteriormente, na hora de cicatrizar. Para que possamos finalmente embalsamar nossa alma com frieza e indiferença, para evitar a putrefação causada pela dor, que — de qualquer forma — no final é inevitável.

 Sentimentos são o que nos mantém vivos, mas por que essa dificuldade horrenda de lidarmos com eles? 

Todos os dias acordamos felizes, alegres, saltitantes? Não. Então, por que manter esse malogrado sorriso no rosto, o “bom dia!” na ponta da língua, o “tudo bem!” ligado no “automático”?

Fingimos o tempo todo nos aceitar e sermos aceitos pelo outro, fingimos o tempo todo pra nós mesmos o bem-estar, quando na verdade existe uma escara jorrando sangue dentro de nós, jorrando litros.

Tenho a impressão real de que a vida será eternamente regrada pelas paixões mal resolvidas, pelos desejos confinados e íntimos, pela ilusão do bem-estar, pelo desespero da sabedoria, pelo confinamento e exorcismo dos sentimentos, e principalmente pelo prazer momentâneo, efêmero e insano de pequenos fragmentos do que chamamos de felicidade.

O que predomina é a vaidade sentimental, temos que estar bem e felizes a todo instante. Isso é enfadonho. Faz a pessoa responder “tudo bem!”, desejar um “bom dia!” pela manhã, sem notar o quanto aquilo foi irrevogavelmente mentiroso. Não. Não está nada bem. É mentira. E não, não lhe desejo um bom dia, é a regra. 

Vaidade sentimental é o que faz a pessoa manter a pose, só pra pensarem que ela é feliz, pois a dor nunca pode ser vivida – revelada, transparente – e saboreada como tem que ser, a depressão nunca pode nos dominar para que nos transforme em algo menos lixoso do que somos, o mau-humor não pode cumprir sua tarefa de nos ensinar a ser menos patéticos, e sabe por quê? Para satisfazer o outro e, mais que isso, causar no outro o incômodo por vê-lo feliz.

E novamente são os outros, sempre eles…

Tudo exaustivo. Tudo tão humano.

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